A Administração Pública, através do Programa ECO.AP 2030, tem a oportunidade, e até a missão, de liderar o caminho da descarbonização do setor hospital, dando continuidade aos trabalhos já desenvolvidos, fortalecendo parcerias e aproveitando a conjuntura atual, incluindo os mecanismos de financiamento disponíveis como é o caso do Plano de Recuperação e Resiliência.

O setor hospitalar apresenta-se num contexto em que enfrenta um conjunto de desafios e oportunidades no caminho da neutralidade carbónica atendendo à intensidade energética inerente à sua atividade, podendo, nesta senda, providenciar uma maior qualidade dos serviços prestados, com menor impacte ambiental, que se repercute a médio e alongo prazo na saúde humana e ambiental.

O setor da saúde demonstra já uma preocupação e um caminho percorrido neste sentido, mesmo em contextos mais exigentes, o que se evidencia através de várias iniciativas, como é o exemplo do PEBC&ECO.AP – Plano Estratégico do Baixo Carbono e o Programa de Eficiência Energética na Administração Pública, que veio dar lugar ao ECO@SAÚDE – Programa de Sustentabilidade Ambiental no Ministério da Saúde,  com a publicação do  Despacho n.º 10372/2021, de 22 outubro, enquadrados nas políticas internas da Área Governativa da Saúde e sob o chapéu do Programa de Eficiência Energética na Administração Pública, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 2/2011, de 12 de fevereiro, (RCM n.º 2/2011) que veio dar lugar ao Programa de Eficiência de Recursos na Administração Pública (ECO.AP 2030), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 104/2020, de 24 de novembro, (RCM n.º 104/2020), o qual se encontra em vigor.

Acredita-se assim que está criado o enquadramento e muitas das condições necessárias para as atividades desenvolvidas pelo Estado, incluindo na área da saúde, continuarem na senda da descarbonização, e desta forma darem o exemplo, através da adoção de medidas que visem uma utilização mais eficiente dos recursos energéticos, hídricos e outros, com repercussões a médio e longo prazo na redução da despesa pública, e providenciando a melhoria contínua na utilização dos equipamentos públicos pelos trabalhadores e pelos seus utilizadores, ou seja, por todos nós.

Certificados Energéticos

Por outro lado, e de uma amostra de 2.422 Certificados Energéticos (CE) de edifícios da área da saúde (privados e públicos), emitidos entre 2014 e setembro de 2021 (novos, existentes e grandes reabilitações), ao abrigo do Sistema de Certificação Energética dos Edifícios (SCE), verifica-se que 46,8% estão entre as classes B- e A+ (cerca e 5% entre A e A+). Com a implementação das medidas de melhoria identificadas nestes CE pelo Peritos Qualificados (PQ), cerca de 80% transitam para Classes Energéticas entre B- e A+ (15% transitam para A e A+). Ainda de acordo com esta amostra de CE, verifica-se que maior parte das necessidades energéticas são para o arrefecimento, iluminação e aquecimento, este em paralelo com outros consumos. Acresce que atuar nos sistemas de iluminação, climatização e sistemas técnicos, onde se inclui a instalação de sistemas fotovoltaicos para produção de energia elétrica, constitui as medidas mais identificadas pelos PQ para alcançar a melhoria da Classificação Energética. Medidas de melhoria ao nível da envolvente (opaca e/ou envidraçada), são aquelas que apresentam, por norma, uma relação investimento versus poupança menos vantajosa, contudo, a sua implementação deverá ser prioritária, sempre que possível, com benefícios ao nível da redução das necessidades energéticas associadas à climatização, por exemplo, e providenciando um maior conforto para os utilizadores, com menores custos. De referir que esta amostra de CE contempla as várias tipologias de estabelecimentos de saúde, incluindo com e sem internamento, entre outros, nas quais as tipologias de necessidades energéticas predominantes podem variar. 

Paralelamente ao ECO.AP 2030 e ao SCE — sendo que estes complementam-se e não se substituem, registam-se outras iniciativas que estão a ser dinamizadas através das quais se privilegiam as parcerias entre diferentes stakeholders com o intuito de, em conjunto, contribuírem para um objetivo comum. A título de exemplo, o Hospital de Santo André do Centro Hospitalar de Leiria, é um beneficiário associado do Projeto Hospital Sudoe 4.0 – Modelos de eficiência energética edifícios hospitalares, cofinanciado pelo Interreg Sudoe, o qual conta com parceiros de três países, Espanha, França e Portuga. Em Portugal, o projeto conta com a participação da ADENE, parceiro responsável pelas atividades de eficiência energética e hídrica no hospital de Santo André, e o Instituto Superior Técnico (IST), a liderar os trabalhos relacionados com a Qualidade do Ar Interior. A Administração Central do Sistema de Saíde, I.P. (ACSS) e a Administração Regional de Saúde do Centro (ARS Centro), são igualmente beneficiários associados, com uma participação muito ativa na implementação do projeto e replicação dos resultados noutros estabelecimento de saúde.

Financiamento

Por fim, não se pode falar em melhoria da eficiência energética e de outros recursos ignorando o “elefante na sala”, de nome “financiamento”. Neste campo, existem diferentes abordagens e origens de financiamento, destacando-se três: 

  • o autofinanciamento, em particular para as medidas com um período de retomo mais curto;
  • para projetos mais integrados e estruturantes de renovação dos estabelecimento de saúde, além de outros, as entidades podem vir a recorrer a Contratos de Gestão de Eficiência Energética (CGEE), enquadrados no Decreto-Lei n.º 50/2021, de 15 de junho, em que a entidade pública, sem ter de investir, contratualiza poupanças de energia a uma Empresa de serviços Energéticos (ESE), a qual assume a responsabilidade de implementar (e manter) um conjunto de medidas e assegurar, durante o período definido (no mínimo 15 anos), as poupanças contratualizadas. A ESE é remunerada pela entidade pública através das poupanças obtidas com a implementação das medidas de eficiência energética. À presente data, aguarda-se a publicação das peças legislativas complementares ao Decreto-Lei n.º 50/2021;
  • o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) prevê, no pilar da Transição Climática, e no âmbito da Componente C13, o Investimento i02 – Eficiência energética em edifícios da administração pública, uma dotação global de 240 milhões de euros, no âmbito do qual se encontra aberto o primeiro aviso, até 30 de março de 2022, uma dotação de 40 Milões de Euros. O PRR, contempla ainda, no pilar da Resiliência, “Qualificar as instalações e os equipamentos dos centros de saúde, assegurando condições de acessibilidade, qualidade, conforto e segurança para utentes e profissionais e adaptando-as aos novos modelos de prestação de cuidados de saúde:..”, ao abrigo do Investimento i01: Cuidados de Saúde Primários com Mais Resposta, onde se inclui a eficiência energética.